Não olho muito para trás, porque não há muito para dizer.
Não me recordo de existir aos vinte, devia ser completamente invisível. Os óculos não ajudavam muito, até porque não existiam os modelitos de hoje todos sofisticados, quase à medida do nosso rosto, que até são usados por quem não tem falta de vista.
Aos trinta continuava a ser um putozeco, com uma vivência peculiar da vida. Conhecia mais parques de campismo e residenciais de quinta categoria nas férias, que restaurantes ou hotéis com algum luxo e maneirismo.
Não tinha amigos com carrões, vivendas ou cartões de livre acesso nas noites lisboetas.
Só uma noite de Agosto, quando estava tudo de férias, menos eu, entrei no Salão Moderno e dancei com a tia do Alfredo, um tango apertado. Ele nunca soube. Nessas férias também me aventurei sozinho pelo Bairro Alto e toquei à porta do “Frágil”. A senhora de peso e mais tarde abraços, abriu-me a porta e deixou-me entrar, coisa rara no nosso grupo “pé de ténis”. Não percebi porquê. Talvez para deleite das bichas solitárias, que tinham os olhos à solta...
Era tudo tão vulgar, tinha namoradas, daquelas que não paravam o trânsito, mas que iam dando para os gastos...
Depois?
De repente tinha quarenta anos, era casado, tinha um filho... já quase não vestia calças de ganga, tinha uma colecção de gravatas e ternos considerável, porque tinha um emprego, que me obrigava a ser o que pensava que não era. Havia qualquer coisa que deixara de contar, parece que não memorizara este tempo, que me ofereceu uma vida normal, com casa, mulher, filho, carro, emprego, como se não fosse nada disso que eu quisesse da vida...
3 comentários:
e eu olho tanto para trás...
(escreves deliciosamente)
Depois?
Onde fica a ponte que liga o passado ao presente e permite um futuro pleno?!...
Um abraço*
Zé, sabes a toda.
- Engravatado de meia tigela!
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